De acordo com Emily Poole, jurista norte-americana, o termo “slut-shaming” significa “envergonhar e/ou atacar uma mulher (…) por ser sexual, ter um ou mais parceiros sexuais, reconhecer sentimentos sexuais e/ou agir de acordo com sentimentos sexuais”. Na tradução literal, significa “envergonhar vadias”.
O termo vem sendo debatido no âmbito jurídico, tendo em vista práticas processuais machistas que envolvem juntadas de “fotos sensuais”, ou alegações no sentido de uma mulher ser ativamente sexual, para desqualificá-la.
A prática é recorrente em ações do âmbito da família, em especial de guarda e alimentos, e também em ações criminais que envolvem crimes contra a dignidade sexual.
Exemplos recentes ilustram o termo, como o caso Mari Ferrer (2019), que denunciou um estupro e teve fotos de bíquini expostas pela parte contrária durante a audiência, numa tentativa de desqualificar a vítima, e comprovar que o ato foi consensual.
Deste lastimável evento surgiu a Lei nº 14.425, conhecida como Lei Mariana Ferrer, aprovada em 2021. Ela coíbe a prática de atos que atentem contra a dignidade da vítima e de testemunhas, com destaque para os atos que ocorram nos casos de crimes contra a dignidade sexual.
Outro caso recente de slut-shaming pôde ser verificado no processo que o surfista Pedro Scooby moveu contra Luana Piovani, genitora de seus filhos. Numa tentativa de proibir que a atriz se pronunciasse na internet acerca dos processos de guarda e alimentos de seus filhos, o advogado do surfista anexou fotos da atriz nua aos autos, visando desqualificá-la enquanto mulher.
Os atos nos remetem à figura da mulher honesta, anteriormente protegida pelo Código Penal. A “mulher honesta”, no Código Penal de 1940, era protegida nos crimes de posse sexual mediante fraude, atentado ao pudor mediante fraude e rapto violento ou mediante
fraude. Ou seja, o Código Penal fazia uma distinção entre “mulheres honestas”, protegidas pela lei contra crimes sexuais, e “mulheres desonestas”, em desacordo com os costumes morais e sexuais da época.
Portanto, o slut-shaming, além de produto de uma sociedade historicamente patriarcal e machista, é também herança de uma previsão legal que distinguia entre mulheres recatadas e mulheres sexualmente ativas ou em desacordo com os ditames morais, e que ainda pode ser verificada nos processos atuais.
A prática é amplamente vedada e ilegal. Para se proteger processualmente dela, há alguns mecanismos legais vigentes.
O slut-shaming pode ser enquadrado enquanto violência psicológica, prevista na Lei Maria da Penha, entendida como “qualquer conduta que lhe cause dano emocional e diminuição da autoestima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem, violação de sua intimidade, ridicularização, exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação”.
Além da Lei Maria da Penha, observado o caso em tela, poderá ser analisada a incidência de crimes contra a honra – calúnia, difamação e injúria.
A Lei Mariana Ferrer pode ser um instrumento útil em casos de slut-shaming também.
Por fim, outro mecanismo legal que pode ser um aliado nos casos de violência processual por slut-shaming é o Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero (CNJ, 2021), que conta com largo arcabouço teórico que deve nortear os(as) julgadores(as).
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